Da série: Contos


Olá, como estão? Bom, já faz um tempo que escrevi um conto e algumas amigas me disseram para postar no blog. Não sabia ao certo se colocaria ou não, até pelo fato dele ser um pouco longo. Mas enfim, decidi postar. Ele será dividido em duas partes. Boa leitura, espero que gostem!

Um monstro chamado Clarice (Parte Um)

Hoje eu acordei no meio da madrugada, devia ser duas horas e quarenta e cinco minutos de uma terça-feira. Lá fora estava ventando e esse vento estava congelando meu quarto. Às vezes eu acordo essa hora, mas sempre trêmula, como se em meus sonhos tivessem levado toda a minha esperança. Porém hoje foi diferente. Eu estava confusa, entretanto, já não me culpo por isso – sessenta e três invernos vividos, nem sempre é fácil recordar de todas as tempestades – contudo havia algo em mim, além de meu sorriso, que me dizia que eu estava feliz. Uma velha, no meio da madrugada, esbanjando um sorriso largo, só podia ser início de loucura. Mas não era.
Agora eu estava no ano de mil novecentos e sessenta e seis, vestindo meu casaco cinza-escuro numa tarde nublada de junho. Eu morava com meus pais, Elizabeth e Fernando, no sétimo andar de um condomínio chamado Guirnevitch. Andradas, a cidade em que vivíamos, era calma e meu lugar preferido era a Praça Central, distante poucas quadras do nosso condomínio. Nessa tarde, como geralmente fazia aos sábados, estava a caminho do meu refúgio urbano. Quando estava chegando à Praça Central, escutei meu nome saindo suavemente por alguma boca.
_Clarice! – Dizia alguém não muito distante.
Olhei para trás, era George, meu colega de classe que comportava em seu rosto pálido um belo par de olhos azuis. Ele era alto, magro e carregava consigo o sotaque americano de onde nascera. Como qualquer garota da minha idade, eu também me derretia por George – apesar do frio.
Junto a seu peito, George trazia alguma revista em meio a folhas de seu caderno preto. A cada passo que ele tomava em minha direção, meu coração tornava a bater mais forte. As benditas borboletas no estômago não paravam de voar dentro de mim. Em meio a tudo isso, eu tentava me acalmar e aguardar George chegar ao meu encontro.
Agora, estávamos distantes apenas por uma rua. Quem sabe quando George atravessasse, nossas mãos se entrelaçassem e nosso destino seria o mesmo para sempre. Meu corpo tremia de felicidade por sua presença. Mais alguns passos e eu já poderia abraçá-lo. Apenas mais.
_Não, não, não! George, acorde! George! – Eu gritava no meio da rua.
_É para você, Clarice. – Me mostrara a revista, indicando que era para mim. Foram suas últimas palavras.
Em poucos segundos, a minha felicidade fora devastada pelo pesadelo de ter George em meus braços, com o coração parado e seus olhos fechados.
_Maldito carro! Maldito seja o destino! – Praguejava em meio a lágrimas e a multidão que se formara na rua.
A vida, a danada da vida. Ela gosta de nos dar e nos tirar as coisas boas. Ela gosta de roubar nossos sonhos e brincar com a esperança. A vida.
Eu fui para casa, me aconcheguei no abraço de meus pais e adormeci. No outro dia seria o enterro de meu... não, não sei o que posso dizer o que ele era meu. O mais certo seria dizer que amanhã seria o enterro do que a vida nunca deixou ser meu.
Não dormi por muito tempo. Levantei às sete horas da manhã, tomei um longo banho, coloquei meu casaco cinza-escuro, respirei fundo e entrei no carro. Papai e mamãe sabiam de minha aflição, embora eu não deixasse transparecer.
Chegamos ao cemitério e sua aparência demonstrava todo o meu sentimento. A brisa fria e o dia cinza apenas contribuíam com o meu pranto. O clima não poderia ser outro: apenas dor e sofrimento.
No final, quando já estávamos a caminho de ir embora, uma voz muito semelhante à de George sussurrou para mim.
_Clarice! – Dizia baixinho, o pai de George.
_Pois não, Sr. Willian. – Respondi triste e calmamente.
_Quando George foi atropelado, carregava consigo uma revista em quadrinhos, onde dizia na capa seu nome. Acho que ele queria presenteá-la com ela. Pegue, é sua.
Com lágrimas nos olhos e a voz completamente rouca, agradeci.
_Muito obrigado, Sr. Willian. Sinto muito pelo George.
Foi difícil conter a emoção e, em meio a um rápido abraço, despedimo-nos.
Coloquei a revista abraçada ao meu peito, sentindo-me culpada pelo que acontecera a George. Em meu rosto rapidamente corriam lágrimas, mas não eram mais fortes que a dor em meu coração.
O dia havia sido triste. Minha cabeça girava encostada em minha cama. A dor que acometia minha cabeça acabara por ser maior que meu sono. Nessa noite, não adormeci.

2 comentários:

  1. Adorei esse conto, não canso de ler ele. Sinto tua falta, beijos, segue sempre escrevendo assim que tu vai longe, minha flor. Se cuida!

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    1. Muito obrigado, meu anjo, do fundo do meu coração <33 Nem me fala, eu to morrendo de saudade tua sua chata, mas calma esse core que logo logo a gente já vai estar juntas. Te cuida também!

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